Mudança de paradigmas: A maneira de louvar como aferidor da espiritualidade

Se existe um assunto que dá pano para manga é o estilo de louvor de uma igreja. Você sabe, “louvar não é apenas cantar”. Você pode louvar sem cantar e pode cantar sem louvar. Mesmo que você esteja cantando as maiores maravilhas a respeito de Deus, pode ser que o que sai dos seus lábios nada mais é do que arte musical. É muito fina a linha que separa a música que louva e adora da música que faz uma mera “apresentação”. O que ocorre é que para tentar evitar que esse erro nos atinja, nós criamos alguns paradigmas. Vamos pensar em alguns deles.

1. O louvor musical na igreja tem um papel secundário. A Palavra (entenda-se a pregação ou sermão) é a parte mais importante da reunião

É óbvio que a Palavra de Deus tem um papel fundamental na vida de uma igreja e é claro que ela precisa ser valorizada. Só que valorizar a Palavra de Deus não significa necessariamente que a pregação precisa ter duas horas e meia e o período de cânticos dez minutos. Na maioria das vezes, isso é estabelecido pelos próprios pregadores e líderes, que gostam de ouvir a sua própria voz… Algumas vezes sinto-me constrangido quando prego e o dirigente me apresenta com uma frase mais ou menos igual a esta: “Agora, vamos para a parte mais importante da reunião, o irmão fulano veio de tal lugar para nos trazer a mensagem”. Espera aí, companheiro: o que aconteceu antes da mensagem era menos importante por quê? Quem disse isso? De onde tiramos este modelo? Louvar a Deus com canções e música não fazia parte do mesmo culto? Ou era somente um pedaço do programa, nada mais?

Creio firmemente que os ajuntamentos do povo de Deus não podem ser divididos em compartimentos. É isso que faz com que alguns só queiram a primeira parte e outros a segunda. Tudo deve ser encarado como uma única peça. Nós damos a Deus o nosso louvor e recebemos dele a Sua instrução. E cada uma dessas coisas tem a sua importância idêntica.

2. O estilo de música que se canta determina se uma igreja é espiritual ou carnal. É preciso cantar “música sacra”

Para muitos, os hinários antigos pertencem ao Cânon das Escrituras. São “imexíveis”. Para esses, pode-se aplicar aos hinários as palavras de Apocalipse: “Ai dos que acrescentarem ou tirarem qualquer coisa das palavras deste livro!!!” Qualquer coisa nova que tenha saído depois da última edição do hinário (seja ele qual for) seja anátema! Para outros, os hinos não passam de peças arcaicas, ultrapassadas. Para esses, tudo o que é antigo não presta. Tem que ser substituído. Só devemos cantar no domingo que vem as músicas do CD lançado no sábado passado, no Mineirão.

Santas bobagens! Nem é verdade que tudo o que é velho não presta, nem que tudo o que é novo não presta. Para uma coisa prestar ou não, não é a data que manda. A contabilidade vem do tempo do Código de Hamurabi, e a gente usa até hoje. Já a “união civil homossexual” é a última moda e é uma abominação terrível. Por outro lado, não existe música “sacra”. Existe “música”. Quem a sacraliza é quem a produz e quem a canta. Se não é assim, por que aceitamos como “sacros” os hinos nacionais da Inglaterra ou da Alemanha e não o do Brasil ou o da Jamaica? A Europa é mais santa do que a América?

Se formos honestos, concluiremos que o estilo de música é muito mais uma questão de GOSTO e CULTURA do que de ESPIRITUALIDADE. Se o que cantamos é verdadeiro e espiritual, a maneira como cantamos é o de menos. Fico super à vontade para falar disso porque eu amo os hinos antigos (embora não goste de TODOS – é uma questão de gosto) e amo as músicas contemporâneas (embora também não goste de TODAS). Mesmo assim, canto TODAS as músicas pedidas na igreja, velhas ou novas, mesmo que não “goste” do seu estilo, porque entendo que o louvor não é para agradar a mim, mas ao Senhor que o recebe. O que a gente tem que analisar em qualquer canção cristã é a sua base bíblica, doutrinária, onde encontraremos parâmetros divinos. Não o ritmo que a acompanha, porque aqui o certo ou errado depende do parâmetro humano.

É muita ingenuidade tentar definir a espiritualidade de uma igreja pelo tipo de música que ela canta. Você pode cantar “Mais perto quero estar, meu Deus, de Ti” toda semana e ser o maior pilantra da história. Sua igreja pode cantar “Santo, Santo, Santo, Salvador Divino” em vozes e tudo e ser a igreja mais profana da face da Terra. Da mesma maneira que cantar “Rompendo em Fé” ou “Corpo e Família” não significa que a sua igreja seja mais efetiva nem mais viva.

3. A postura física das pessoas enquanto louvam precisa ser deste ou daquele jeito

Há uma acalorada discussão a respeito do que pode e do que não pode fazer enquanto a igreja louva. Se bate palma, se levanta a mão, se abaixa o pé, se estica o pescoço, se faz gestos, se brinca de “morto-vivo”, se faz “estátua”.

A maioria de nós estranha a idéia de uma igreja que manifeste alegria ou júbilo de maneira natural e espontânea, sem considerar como estes sentimentos se exteriorizam em cada cultura. Há alguns anos, quando visitei Angola, fui a uma igreja num domingo, onde um grupo de adolescentes e jovens apresentou uma música sobre a volta de Cristo. Se alguns dos nossos líderes brasileiros vissem a maneira como eles apresentaram esta canção, ficariam escandalizados. Chamariam aquilo de “dança carnal”. Era apenas uma manifestação incontida de alegria, da parte de um povo sofrido que se emociona e vibra, literalmente, com a esperança do arrebatamento. Nada mais espiritual do que isso.

É preciso tomar muito cuidado antes de simplesmente chamar espontaneidade de irreverência, alegria de algazarra, emoção de emocionalismo, júbilo de carnalidade. Devemos lembrar que muitos desses rótulos tem a ver com a mentalidade com que fomos criados, que (talvez inconscientemente) trouxe para a nossa realidade um conceito de expressão diferente do nosso, latino-americano. Lembro-me de um comentário que ouvi de um irmão europeu (a quem respeito e amo profundamente) que disse ter-se impressionado na primeira ceia que assistiu na vida porque “o silêncio era tão sepulcral que daria para ouvir um alfinete caindo no chão”. Claro que é preciso compreender a época, a cultura e a criação de uma pessoa que diz isso. Fosse ele um brasileiro como eu e sua reação provavelmente teria sido completamente diferente. Eu não voltaria nunca mais. E não é porque somos melhores ou piores. Simplesmente somos diferentes. Nascemos em países diferentes, temos uma maneira diferente de expressar sentimentos e por aí vai. Isto se aplica não somente a pessoas de nacionalidades diferentes. Dois brasileiros podem reagir de forma oposta a este assunto, é óbvio. Em qualquer caso, o que se vê é a tentativa de se estabelecer um paradigma (modelo, padrão, protótipo) baseado em maneiras pessoais de se ver as coisas.

Fomos proibidos de nos emocionar diante do Senhor porque isso poderia virar manipulação. Fomos proibidos de sorrir porque isso denotaria imaturidade. Fomos proibidos de dizer “amém” porque isso poderia parecer pentecostal. Com base em quê?

O segundo alerta

Se o louvor que se oferece a Deus na igreja está partindo do coração sincero de verdadeiros adoradores, não há qualquer motivo para cercearmos o seu tempo nem a sua intensidade. Se, porém, o que chamamos louvor não o é de fato, precisamos atacar a verdadeira causa de não ser. O que a gente não pode fazer é generalizar, rotulando sumariamente com a mesma etiqueta os sinceros e os que querem aparecer.

Sim, infelizmente há aqueles que não são adoradores verdadeiros e que estão cantando e tocando na igreja apenas para fazer o seu “showzinho”, mostrar suas habilidades musicais e observar as reações da platéia à exibição do seu talento. Não me venha com essa de que “você não pode julgar o meu coração, se sou ou não sincero”. Estou cansado de ver músicos que quando acabam de tocar, nem disfarçam. Para eles, a reunião acabou ali. Ficam do lado de fora, batendo papo, bebendo água, conversando em rodinhas, sem dar a mínima bola para o que continua acontecendo no salão. Não é preciso julgar o coração quando isso acontece. É a sua própria atitude externa que os denuncia. Se você quer saber da seriedade de um músico, olhe para a vida dele. Qual o seu interesse na Palavra? Quanto ele conhece a Deus? Qual o seu nível de compromisso com o Senhor e a Sua obra? Como é a sua adoração quando ele não está tocando? Ora, se não há nenhum sinal de crescimento e envolvimento sério, é preciso orientar, ministrar, discipular. Se insistirem em misturar as coisas, o negócio é dar cartão vermelho e tirá-los do foco dos holofotes.

Pensando bem:

“Só porque você não gosta, você não pode dizer que é pecado.” Don Francisco