Vitória sobre o temperamento

Trinta e sete anos de idade. Magro, quase frágil. Ficando calvo e de óculos. Um entusiasta da eletrônica. Obediente à lei e cansado. Certamente não é uma descrição que você faria de um vigilante.

Mas isso não incomodou o público americano. Quando Bernhard Hugo Goetz alvejou quatro pessoas que pretendiam realizar um assalto em um metrô de Nova Iorque, ele imediatamente tornou-se um herói.

Não é difícil ver por quê.

Bernhard Goetz foi uma fantasia americana que se tornou realidade. Ele fez o que todo cidadão quer fazer. Ele reagiu. Ele “deu um chute no nariz do meliante”. Ele “agarrou o adversário pela cabeça”.

Este modesto herói incorporou uma raiva de âmbito nacional, até de âmbito mundial: uma paixão por vingança. As pessoas estão loucas. As pessoas estão bravas. Há uma fúria em ebulição, reprimida que nos leva a brindar um homem que intrepidamente (ou medrosamente) diz, “Não vou tolerar mais isto!” e então sai com uma pistola ardente em cada mão.

Estamos cansados. Estamos cansados de sermos intimidados, atormentados e amedrontados. Estamos cansados de assassinos em série, estupradores e assassinos de aluguel.

Estamos furiosos com alguém, mas não sabemos quem. Estamos assustados com algumas coisas, mas não sabemos o quê. Queremos reagir, mas não sabemos como. E então, quando um Wyatt Earp dos dias atuais entra em cena, nós o aplaudimos. Ele está falando por nós! “Caçador de criminosos, é assim que se faz!”

Ou é? É realmente assim que se faz? Vamos pensar sobre a nossa raiva por um minuto.

Raiva. É uma emoção característica, mas previsível. Começa como uma gota d’água. Uma chateação. Uma frustração. Nada grande. Somente uma irritação. Alguém pega a sua vaga no estacionamento. Alguém pára na sua frente na auto-estrada. Uma garçonete está devagar e você está com pressa. A torrada queima. Gotas d’água. Pingam. Pingam. Pingam. Pingam.

Porém, esteja farto destas gotas de raiva aparentemente inocentes e em pouco tempo você tem um balde cheio de raiva. Vingança ambulante. Amargura cega. Ódio fixo. Não confiamos em ninguém, mostramos os dentes para qualquer pessoa que chega perto. Nós nos tornamos bombas de ação retardada ambulantes que, com a tensão e o medo adequados, poderia explodir como o Sr. Goetz.

Agora, isso é maneira de se viver? Que bem o ódio já trouxe? Que esperança a raiva já criou? Que problemas já foram resolvidos pela vingança?

Então, o que fazemos? Não podemos negar que nossa raiva existe. Como a controlamos? Uma boa opção é encontrada em Lucas 23:24. Aqui, Jesus fala sobre a multidão que o matou. “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que estão fazendo”. Você já quis saber como Jesus impediu a vingança? Você já perguntou como Ele manteve o controle? Aqui está a resposta. É a segunda parte da sua declaração: ”pois não sabem o que estão fazendo”. Olhe atentamente. É como se Jesus considerasse esta multidão sedenta por sangue, faminta por morte não como assassinos, mas como vítimas. Como se Ele os considerasse não como uma multidão militante mas, como Ele colocou, como “ovelha sem um pastor”.

“Não sabem o que estão fazendo”.

E ao passo que você pensa nisso, eles não pensam. Eles não têm a mais vaga idéia do que eles estavam fazendo. Eles eram uma multidão louca por comoção, furiosa com alguma coisa que eles não conseguiam enxergar, então eles descontaram isso em, de todas as pessoas, Deus. Mas eles não sabiam o que estavam fazendo.

E na maioria das vezes, nem nós sabemos. Ainda estamos, por mais que odiemos admitir isso, sem pastor. Tudo o que sabemos é que nascemos sem uma eternidade e estamos assustadoramente perto de outra. Brincamos de etiqueta com as indistintas realidades de morte e dor. Não conseguimos responder nossas próprias perguntas sobre amor e mágoa. Não conseguimos nos manter fora da guerra. Não conseguimos nem nos manter alimentados.

Paulo falou pela humanidade quando confessou, “Não sei o que estou fazendo.”1

Agora, eu sei que isso não justifica nada. Isso não justifica motoristas que batem e fogem ou camelôs de pornografia infantil ou traficantes de heroína. Mas ajuda a explicar por que eles fazem as coisas desprezíveis que fazem.

Meu ponto é: a raiva incontrolável não irá melhorar o seu mundo, mas a compreensão solidária irá.

Uma vez que enxergamos o mundo e nós mesmos como somos, podemos ajudar. Uma vez que nos entendemos, começamos a agir não a partir de uma postura de raiva, mas de compaixão e de preocupação. Olhamos para o mundo não com olhares carrancudos amargos, mas com mãos estendidas. Percebemos que as luzes estão apagadas e que muitas pessoas estão tropeçando na escuridão. Então acendemos as velas.

Como Michelangelo disse, “Nós criticamos criando.” Ao invés de reagirmos, nós ajudamos. Nós vamos aos guetos. Nós ensinamos nas escolas. Nós criamos hospitais e ajudamos os órfãos… e guardamos nossas armas de fogo.

“Não sabem o que estão fazendo”.

Há algo a respeito de compreensão do mundo que nos faz querer salvá-lo, até morrer por ele.

Raiva? A raiva nunca fez bem a ninguém. Compreensão? Bem, os resultados não são tão rápidos quanto a bala do vigilante, mas certamente são muito mais construtivos.

1 Romanos 7:15, paráfrase do autor.

Guia de estudo

I. Raiva. É uma emoção característica, mas previsível. Começa como uma gota d’água… Porém, esteja farto destas gotas de raiva aparentemente inocentes e em pouco tempo você tem um balde cheio de raiva… Nós nos tornamos bombas de ação retardada ambulantes que, com a tensão e o medo adequados, poderia explodir como o Sr. Goetz.

    A. Quão “grave” pecado é a raiva, considerando Gálatas 5:19-21?

    B. De acordo com estas passagens, o que tipicamente acompanha a raiva: Provérbios 14:17, 29; Eclesiastes 7:9; Tiago 1:19-20? O que estas passagens indicariam como antídotos para a raiva? Em vista destas passagens, você diria que “contar até dez” tem algum valor?

II. A raiva incontrolável não irá melhorar o seu mundo, mas a compreensão solidária irá. Uma vez que enxergamos o mundo e nós mesmos como somos, podemos ajudar.

    C. O que te faz ficar com raiva? Você já ficou com raiva incontrolavelmente? Como você se sente? O que o ajuda a controlar sua raiva?

    D. Quando Estevão foi apedrejado até a morte, ele pronunciou uma declaração parecida com a de Jesus. Leia Atos 6:8-15 e 7:54-8:1. Que paralelos há entre o caráter de Jesus e de Estevão? Como suas palavras em suas mortes afetaram as pessoas que estavam em volta deles?

    E. Goetz se preparou para uma situação que o deixou com raiva carregando uma arma de fogo. Com que “armas” você poderia se armar para você ser capaz de lidar com uma situação difícil com compreensão ao invés de raiva?

Traduzido por Cynthia Rosa de Andrade Marques
Texto original extraído com permissão do site www.maxlucado.com