V de Vingança

Existe um preconceito natural de parte do público contra os filmes adaptados de histórias em quadrinhos. Eles seriam simplesmente oportunistas, marqueteiros e espetaculosos, de acordo com uma platéia, digamos, menos ligada à cultura pop. Esqueça! Primeiro, porque os mais puristas não chamam V de Vingança de História em Quadrinhos, mas sim de Graphic Novel de Alan Moore, que já é uma coisa bem mais sofisticada. E segundo porque – independente de sua origem – trata-se realmente de um filmão! Ação, aventura, ficção científica, política, crítica social, romance… “V de Vingança” tem um pouco de tudo. E bem dosado.

A trama se passa num futuro não muito distante, quando o mundo – agora bem diferente – vê a Inglaterra se reerguer outra vez como uma poderosa potência global. Principalmente depois que os EUA perderam uma grande guerra. Porém, o poder inglês é absolutista e corrupto. Não por acaso, seu líder maior, Adam Sutler (John Hurt) é conhecido como Chanceler, cargo que ocupava Adolf Hitler. As cores do governo também são negro e vermelho, como as do Nazismo. E, como acontece em todas as ditaduras, os meios de comunicação são dominados pelo Estado. Neste panorama assustador, surge pelas ruas londrinas a enigmática figura de V (Hugo Weaving, o Agente Smith da trilogia Matrix), uma espécie de super-herói mascarado, culto e perturbado, que em sua primeira aparição faz lembrar uma mistura de Batman e Zorro. Mas, se Batman tem o mordomo Alfred e Zorro tem o criado Bernardo como confidentes, V terá como parceira a bela Evey (Natalie Portman, a Princesa Amidala de Star Wars), uma simples funcionária da televisão inglesa, mas com um passado dos mais amargos. Quando V salva a vida de Evey nas escuras ruas de Londres, ambos se conectam de maneira irreversível. Tornam-se amigos, cúmplices e parceiros no mirabolante plano de V: explodir o edifício do Parlamento Britânico.

Nem parece que o diretor James McTeigue é um estreante. Ele mostra que aprendeu bastante trabalhando como diretor assistente da trilogia Matrix e do episódio II de Star Wars. Talvez tenha até superado seus mestres. Apoiado na produção do sempre pirotécnico Joel Silver (produtor dos blockbusters Duro de Matar, Matrix, Máquina Mortífera e tantos outros), V de Vingança sabe ser ágil e profundo ao mesmo tempo, comercial e pensante, violento e romântico, com potencial para agradar aos mais diferentes tipos de público.

Eu, que não li o original, gostei muito. Como filme.

“Destruir um prédio vai fazer deste mundo um lugar melhor?”, pergunta a cética Evey. “Um prédio é um símbolo. Destruí-lo também”, ensina V. “O povo não deveria temer seus governantes. Os governantes que deveriam temer o povo”, afirma ele em outro momento. Não é preciso ir muito longe para perceber as referências que o roteiro escrito pelos irmãos Andy e Larry Wachowski (sim, os mesmos de “Matrix”) fazem com o “11 de Setembro”. Primeiro, a óbvia questão do prédio e sua destruição como símbolos. Depois, V também tem uma data simbólica (no caso, 5 de novembro) que ele usará como marco. No filme, o ditador poderoso comanda ataques terroristas, põe a culpa nos muçulmanos e se apresenta como salvador da pátria, objetivando assim concentrar mais e mais poderes em suas mãos. Da mesma forma que não foram poucos os que consideraram a possibilidade do próprio George W. Bush ter facilitado os ataques de 11 de setembro, também ter colocado a culpa nos muçulmanos, para assim obter passe livre para roubar o petróleo do Iraque. Adam Sutler, assim como Bush, também manipula o medo para governar. No entanto, é uma utopia dizer que o tipo de terrorismo pregado no filme seja a solução para os grandes problemas da humanidade, mesmo porque, sei que a tendência é só piorar enquanto as mentes dos poderosos tenham seus umbigos como as maiores prioridades. Mais uma vez não custa lembrar que um dia Cristo ensinará a esses fantoches o que realmente significa “governar com mão de ferro”.

Acima de tudo sabemos que a vingança pertence ao Senhor. A máxima bíblica continua (e sempre será) verdadeira: “Dizei aos turbados de coração: Sede fortes, não temais; eis que o vosso Deus virá com vingança, com recompensa de Deus; ele virá, e vos salvará” (Isaías 35:4).