Os cegos da Santa Cecília

“E guiarei os cegos pelo caminho que nunca conheceram, fá-los-ei caminhar pelas veredas que não conheceram; tornarei as trevas em luz perante eles, e as coisas tortas farei direitas. Estas coisas lhes farei e nunca os desampararei” (Isaías 42:16)

Sai do prédio onde presto serviço como jornalista e me dirigi a uma lanchonete onde ocasionalmente faço as refeições. Desci à rua e dois quarteirões adiante avistei a igreja Santa Cecília. Ela fica bem no centro de uma praça rodeada de vendedores ambulantes e ao lado de uma banca de flores, muito bonita por sinal, e que me faz, sempre que passo por ali, parar por alguns momentos para admirar as flores. Este pequeno pedaço de São Paulo fica exatamente na região que leva o nome Santa Cecília e, assim como muitos outros do velho centro, encontra-se em avançada decadência, abandonada pela administração e com vários prédios em ruínas.

Porém, a igreja, alheia a isso, é muito bonita. Possui um domo com a abóbada pintada de verde e a torre do sino, majestosa, tem em sua cúpula, também, um verde jade. A beleza acaba aí. Pessoas entram e saem dela o tempo todo buscando ajuda de quem não pode ajudar enquanto que ao redor dela muitos andarilhos jazem combalidos pela descrença, desânimo e martírios pessoais. Continuei caminhando. Junto à entrada lateral da igreja, um maltrapilho homem enrolado num cobertor sujo tremia. Outro a alguns passos à frente falava palavras desconexas que não compreendia. Do lado direito da parede externa, uma mulher com roupas rasgadas e olhos incrivelmente azuis dava comida a pombos. Provavelmente sobras do dia. Outros mais, deitados ao redor da igreja ou próximos a praça completavam um quadro muito triste.

Parei antes de chegar à lanchonete. Precisava orar por eles. Subitamente, descendo pelo meu lado esquerdo, dois cegos desciam tateando o chão com suas bengalas, abraçados, conversando e sorrindo, muito. Atrás deles, duas senhoras bem vestidas também conversavam alheias à situação ao redor delas. Quando esbocei uma ajuda para acompanhar os cegos até o metrô, próximo dali, um homem simples e de cabelos brancos ofereceu o ombro. Juntos, partiram. Encostado na parede fiz uma volta completa com o olhar e observei mais uma vez a cena que se apresentava diante de mim. Pensei: “meu Deus! Quantos cegos estão completamente perdidos nesse mundo?”

Uma parte de mim ficou triste porque conheço muitas pessoas que entram em lugares bonitos por fora e vazios por dentro para pedir a imagens ocas um milagre; por saber que muitos andarilhos espirituais estão à procura de algo num mundo entregue ao maligno; porque pessoas estão sentadas em bancos feitos na mente dormente ou deitadas em chão duro de coração endurecido. E a tristeza aumenta quando vejo pessoas bem vestidas e bem de vida se recusarem a ajudar o próximo que está com dificuldades mesmo quando ele está bem em frente delas. Mas a outra parte, que se alegra com pessoas que mesmo com limitações físicas descem à rua sem medo, confiantes e que ainda são ajudadas por outras disponíveis e prontas para dar o ombro amigo, graças a Deus é bem maior e me dá esperança que é possível ser e fazer algo.

Naquela tarde vi que os cegos da Santa Cecília estão em toda parte e o que pode ser a grande diferença para esses cegos não é só o que fazemos onde somos conhecidos e quando estamos entre conhecidos, mas sim em todo lugar, a todo tempo e com todos. Naquele breve tempo de minha vida, Deus me mostrou como falar para aqueles cegos e, acredite, não é fácil. Entendi também que o menor descuido pode me fazer agir como um daqueles que tem a visão prejudicada e andam a esmo.

Depender de Jesus é, sem dúvida, o melhor remédio para a cegueira. Saiba que você também pode escolher o seu lado.

“Senhor, pedimos que nos livre da cegueira espiritual em nome de Jesus, amém!”

Fraternalmente em Cristo