21 Gramas

Imagine um filme com cerca de 150 cenas* completamente amarradas contando a história de 3 personagens diferentes e complexos. Agora imagine essas cenas dispostas sobre uma mesa e embaralhadas pelo mais louco diretor de cinema. Por fim, imagine elas sendo exibidas assim, de forma fragmentada, e você ainda entendendo tudo no final.

Isso é obra de um gênio mexicano chamado Alejandro González Iñárritu. A sua estréia na direção, Amores Brutos (Amores Perros, 2000), estremece o mundo e ele logo ganha Hollywood. Em seguida vem o temor de sua segunda obra, 21 Gramas (21 Grams, 2003), onde já de cara ele escala um elenco de peso: Sean Penn, Naomi Watts e Benicio Del Toro. Era a oportunidade para Iñárritu decolar ou voltar para o México queimado, e ele não decepciona.

21 Gramas é um filme intenso, com profundas reflexões, que analisa com frieza temas como o valor da vida, a inevitabilidade da morte e a necessidade de vingança. Entretanto, imagine esses temas sendo abordados diante da sociedade estadunidense que já havia experimentado a dor do 11 de setembro e presenciava a retaliação diante do Iraque. Quanta ousadia! E o filme funciona bem, tanto como filme, quanto como reflexão.

Seu início é bem confuso e chega até a dar a impressão de que nunca vamos entender o que está acontecendo de fato. De repente vemos Paul (Penn) deitado num leito de hospital e mantido por aparelhos e no segundo seguinte o vemos diante da porta de Cristina (Watts), uma loira, logo depois de descobrirmos que ele é casado com uma morena. Jack (del Toro) é um cristão fervoroso todo tatuado convertido depois de anos na prisão que precisa conviver com um sentimento de culpa que ele não consegue abandonar. E o trio (Jack, Cristina e Paul), inicialmente separado, é ligado acidentalmente pela… morte. Ficou mais confuso ainda? Até agora não consegui alcançar a genialidade do diretor que fez com que tudo isso se tornasse claro no decorrer de uma película altamente confusa e alinear. É só conferir para entender.

Vale lembrar que é um filme forte filmado sem concessões. Iñárritu é um cineasta obcecado por imagens de impacto e o filme não é aconselhável para pessoas impressionáveis. No entanto, no momento mais forte do filme, a cena do atropelamento já previamente esperado devido à narrativa fragmentada, ele narra com uma sutileza que nos deixa mais angustiados do que se tivéssemos visto a cena. Fico arrepiado só de lembrar.

* O número de cenas foi um chute. Eu não contei.