Tem uma família na Bíblia que é composta por um homem que brigou com seu irmão pela herança do Pai. Ele enganou o pai moribundo e roubou os direitos do primogênito. Esse mesmo homem teve que fugir do irmão irado e foi viver com um tio. Lá, apaixonou-se pela prima. O tio o escravizou por sete anos pra dar a prima em casamento, mas, na hora do “vamo vê”, colocou a prima mais velha no lugar. Para conquistar o direito de casar com a verdadeira amada na semana seguinte, o noivo teve que se comprometer a mais sete anos de trabalho.

Casado com duas, ele preferia uma e desprezava a outra. Esta, contudo, era a que lhe dava filhos. As duas irmãs se estranhavam pelo amor do marido ao ponto da mais nova oferecer uma escrava dela para ter filho com ele. Não tinha bebê de proveta ou barriga de aluguel. O método era o coito mesmo. A escrava engravidou e a outra esposa resolveu fazer o mesmo. O cara já tinha duas mulheres e duas concubinas, quando teve filho com a mulher que amava de verdade. Obviamente, dos 11 filhos e 1 filha que ele tinha, o mais novo era o seu filho preferido. Mas muito preferido. Ao ponto de o pai dar presentes pra ele enquanto os outros só olhavam. De tanta raiva que tinham do caçula, os outros irmãos resolveram dar um fim nele e o venderam como escravo para uns estrangeiros. E ainda mentiram para o velho pai dizendo que ele estava morto!

O pai bígamo ainda teve mais um filho que foi chamado pelo belíssimo nome de “filho da minha dor”, isso porque a esposa preferida do cara morreu no parto. Mas aí o pai achou mancada e chamou de “filho da minha direita” e deixou por isso mesmo.

Essa família absolutamente disfuncional ainda teve outros problemas graves. Dizem que o avô do bígamo era casado com a própria irmã. Ele também teve filho com uma escrava (vejo um padrão aí), mas chutou ela de casa com o próprio filho para o meio do deserto.

Os filhos do bígamo se meteram em altas roubadas: a única filha mulher foi estuprada e seus irmãos a vingaram com uma chacina. Sério, mataram um povo inteiro para vingar a honra da moça. Outro filho dele engravidou a própria nora, viúva de seu filho, achando que era uma prostituta. E ela não teve filhos antes porque o seu cunhado praticava coito interrompido com ela para não engravidá-la.

Bom, essa é a família tradicional bíblica. A família do Antigo Testamento que deu origem ao povo que Deus escolheu para si. É sobre essa família que Deus disse para o avô, lá atrás: “Em ti serão benditas todas as famílias da terra”. Sim, essa família louca seria benção para todas as famílias do mundo, incluindo a sua e a minha. Como isso é possível? É que a bênção da família não é mérito dos seus membros, é compromisso de Deus. E o Deus fiel abençoa o mundo inteiro através de seu próprio filho que também é filho dessa confusão que contei aí em cima. Um descendente dessa casa disfuncional chegaria ao mundo para que fôssemos adotados por Deus. E é na sua retidão que as nossas famílias tortas são justificadas. É nele que a promessa da benção é concretizada.

O desafio da família cristã não é o de se apegar a um modelo de família “Doriana”. Tampouco é viver como se os laços fossem meras convenções. O desafio é o de, independentemente de nossos históricos familiares disfuncionais ou dos modelos não tradicionais em que fomos criados, encontrar nossa identidade e modelo na nova família espiritual que recebemos em Cristo. É encher a família dos pecadores com a nova vida do filho.

A família do bígamo não sumiu. Mesmo composta de gente que não valia nada, a fidelidade de Deus a sustentou. Tanto que os nomes dos 12 filhos dele estarão escritos pela eternidade toda em 12 portas de uma cidade conhecida como Nova Jerusalém, onde não haverá traição, inveja, estupro, chacina, desprezo, bigamia, mentira, dor ou morte. Pois os pecadores que lá habitarão não carregarão a identidade de suas famílias disfuncionais, mas a do Pai Celeste que os adotou.