O punhal

Quando se precisa de um médico vamos ao hospital. Quando o dinheiro acaba corremos ao banco. E quando precisamos de compreensão? Quando os alimentos acabam vamos ao supermercado, quando precisamos de roupas a alguma loja, e quando necessitamos de apoio ou compaixão? Pensei nisso quando procurava um hospital e me deparei com um, “Casa de Misericórdia”, pensei “Este é o lugar certo!”. Seria simples bater na porta e pedir uma xícara de misericórdia, mas não é assim tão fácil. Aceitar, receber, entender a misericórdia não são coisas fáceis. O engraçado é que sabemos que precisamos, mas não sabemos compartilhar. Sabemos que alivia o fardo, mas não fazemos isso por alguém. Penamos com explicações, vagamos em solidão, choramos as lágrimas da falta de credibilidade. É a dura lei da vida, e não há amigos, igreja ou qualquer coisa que alivie o fardo. A história conta que “misericórdia” era o nome dado a um punhal que os cavaleiros traziam do lado direito usado para matar o adversário que agonizava. O punhal significava o alívio. Claro que para nós acidentais a morte não é vista como alívio, mas repare na riqueza do ato, aliviar um sofrimento, cessar a agonia. Isso é misericórdia.

Refletindo sobre isso pude entender por que somente as misericórdias de Deus se renovam a cada manhã. Segundo a Bíblia, Seu amor é infinito, Sua bondade dura para sempre, mas Sua misericórdia precisa ser renovada. É como um suspiro de Deus, como se Ele contasse até dez do mesmo jeito que minha mãe fazia pra não perder a paciência. Não deve ser fácil erguer quem sempre caí, orientar quem não obedece, ajudar quem acha que já sabe tudo… De todos os versículos, o que para mim mais revela a abragência dos atos de Deus é este: “Ele não veio quebrar a cana rachada, nem apagar o pavio que fumega”. Ele não veio destruir seus sonhos, Ele não vem para separar você de tudo que gosta de fazer, Ele não vem para dizer que você está errado… Ele vem aliviar o que agoniza. Quer provas disso? Pergunte à mulher adúltera o que ela ouviu de Jesus quando foi pega em um erro grave, ou vá até Pedro e sonde se após ter negado Jesus, ele escutou um sermão do tipo: “Eu te avisei que isso ia acontecer, eu falei, mas você não ouve!”. Sem falar de Tomé quando duvidou, quando questionou o próprio Deus que estava ali diante dele, será que ele não merecia uma patada sem tolerância nenhuma? “Se não pode acreditar em mim, não faz parte do meu grupo… afinal não lhe devo satisfações”. Não foi assim. Em todos os momentos Jesus tinha uma atitude de misericórdia.

Para a mulher adúltera um voto de confiança “…vá e não peques mais.” Será que ela acreditava ter essa capacidade? Para Pedro a renovação da amizade, pães e peixes preparados e a certeza de que o amor de Pedro por Jesus tinha maior importância: “Pedro, tu me amas?”, “Claro, Senhor!”. E para Tomé a certeza para as dúvidas, o espaço para ser humano, erronêo: “Vem e vede!” e Tomé viu e tocou e se lavou num rio de misericórdia. E agora vem a velha pergunta : E quanto a mim? A você? A todos? Será que ainda devo continuar perambulando, tentando ser perfeita, sendo ofensiva, sendo rígida, robótica? As misericórdias se renovam, e Deus quer da-lás a nós. Talvez você precise perceber a mão que toca no seu ombro depois daquela discussão terrível, nos momentos em que o velho homem transforma você num monstro carnal, é Jesus sussurando: Não peque mais, você consegue!

Ou naqueles dias em que o mundo nos atraí, ainda que em pensamentos, Jesus nos pergunta : “Me ama? É isso que importa!” , é a sua porçao de misericórdia. E nos momentos em que a tribulação é grande demais, o dinheiro acabou, o estresse sufoca, a família se separou, doenças, você duvida, você questiona: Onde está Deus?! Você perde a convicção, talvez até a fé… Ele segura na sua mão e diz: Vem e vê! Jesus é o punhal que alivia nossas dores, Ele é a mão estendida, é o carinho, é a misericórdia… você só precisa entender o quanto precisa dela.

por Érika Silva Santos