Meus pêsames

Amigos, retornando ao velho hábito de comentar o fato da semana, nos encontramos com um lamentável episódio: o passamento do sr. Roberto Marinho, presidente das Organizações Globo, o mais fabuloso império de comunicação de todos os tempos neste país. É bem verdadeira a declaração do profeta de que “Deus não tem prazer na morte do ímpio”. Não tem mesmo. Ele não sente qualquer alegria ou contentamento porque morreu algum homem, seja ele branco, preto, rico, pobre, poderoso ou impotente, caridoso ou assassino. Por isso, os que o servem também não devem ter. Não fico feliz quando alguém morre. Mesmo que me fosse legítimo condenar alguém à morte, não o faria com prazer. Assim, só faço lamentar a morte de Marinho. Sinto sua perda como a perda de uma vida humana. Imagino como se sentem nesses dias seus filhos. Também fui separado de meu pai pela morte há poucos meses e agora posso dizer o que isto representa.

Mas este acontecimento trouxe à tona vários aspectos. Digo isso porque, estranhamente, a morte de uma pessoa automaticamente a promove aos mais nobres postos da humanidade. Para tornar-se um herói, basta morrer. Se você não conseguir realizar em vida alguma coisa que o torne distinto dos demais mortais, não se preocupe. No dia do seu enterro, haverá dezenas de pessoas aclamando o quão importante você foi, quão dignas foram suas realizações, quão grande era o seu coração.

Assim foi na semana passada. Mesmo de pessoas e setores que até quarta-feira preferiam ver o diabo a ver Roberto Marinho, ouviram-se os elogios mais rasgados, eloqüentes e, diga-se de passagem, os mais exagerados. Só vi coerência na nota de Leonel Brizola. Não que o admire, fique bem claro. Mas foi o único a reafirmar, em matéria paga na Folha de São Paulo, que tinha sido inimigo de Marinho e não escondia isso só porque o homem se fora. Causou-me espécie ver a bajulação explícita, típica dos tempos áureos da ditadura, de homens como o presidente operário recém-eleito pelo povo e seus fiéis escudeiros. A vida toda, que me conste, foram inimigos figadais. Ao longo de suas histórias, acusaram a Globo e seu capo de coisas que nem se sabe se eram mesmo verdades. Agora, decretam luto oficial, param o Congresso para “homenagear ao grande homem e empreendedor Roberto Marinho” e fazem declarações que, no mínimo, deveriam ser evitadas. Bem, este é só mais um capítulo no livro das Decepções Nacionais, que é escrito pela História e que será lançado nas próximas eleições.

De todas as vozes, destaca-se a da concorrente Folha da Manhã, que em matéria extensa e aparentemente bem embasada historicamente, mostra o nascimento e expansão extraordinária da Rede Globo sob os auspícios da ditadura militar que ela própria ajudou a estabelecer e manter. Nunca foi segredo de ninguém que Marinho tinha mais poder do que o próprio presidente. É clássico o exemplo da edição do debate Collor x Lula em 89 e a tendenciosa cobertura dada pela Globo àquele processo eleitoral. Quando, porém, contrariada em seus interesses pelo próprio Collor a quem ajudou a eleger, fez feroz campanha para derrubá-lo até conseguir. Que ingênuos são aqueles que pensam que os cara-pintadas dos anos 90 foram os que levaram Collor ao impeachment!

Claro que é admirável que um homem com 60 anos, quando todo brasileiro já faz contas para se aposentar, resolva iniciar ali uma empresa que se transforma na colossal Rede Globo de Televisão. Òbvio que um homem que chega onde chegou é um empresário e tanto. Não se pode negar o que está diante dos olhos. Porém, falta um ingrediente nesta análise crítica. Um elemento que não será abordado pelos críticos da televisão, nem pelos economistas ou analistas políticos.

Não há indicadores para comprovar qual tem sido a influência devastadora da televisão brasileira, capitaneada pela Globo, que seguindo a tendência mundial de um sistema que jaz no maligno, ataca impiedosamente valores básicos da sociedade, como família, sexualidade, criação de filhos, Deus e espiritualidade. Não se podem medir os divórcios, lares destruídos, as adolescentes engravidando a contragosto e as conseqüentes crianças abandonadas, desamor e rebeldia incutida na cabeça de milhões de jovens por gerações inteiras. As telenovelas, que influenciam desde a moda e as tendências de mobiliário até à maneira de falar das pessoas e que fazem no seu enredo a apologia da insubmissão, da infidelidade, da expressão desenfreada e luxuriante do sexo. Não há Criança Esperança que devolva a esperança daqueles que são ensinados a buscar no ocultismo e na consulta aos astros e aos mortos a direção para suas vidas. Não há esperança para crianças que cresçam tendo em Xuxa e Angélica seus ícones de comportamento. Não há adolescência saudável que seja possível para quem se liga em Malhação ou para quem passe Altas Horas na frente da telinha.

Por isso, sem hipocrisia nem falso moralismo, encaremos a realidade. O que este cidadão prestou ao Brasil ao criar este dragão horroroso foi um desserviço. Seríamos mais felizes sem este Frankenstein. Teríamos menos problemas para tratar em nossas famílias, escolas e igrejas. De um ateu confesso, não se poderia esperar um agente de comunicação de verdades e conceitos bíblicos. De alguém cuja filosofia de vida sempre foi o dinheiro em primeiro lugar, porque “morreu, acabou”; de alguém que ensinou nossos jovens a questionar o que Deus disse como se isso fosse o “moderno”, o “descolado” o “contextualizado”. Nosso país seria melhor, mais justo e até mais culto. Teríamos menos desigualdade social, menos violência e menos ódio, porque não teríamos esse lixo despejado em nossas salas todos os dias.

Lamento, de novo, a perda da vida de um homem. Mas igualmente lamento a perda da vida de uma nação.

Pensando bem:

As entrevistas com personagens bíblicos continuarão, mas revezarão com as tradicionais crônicas.