Reflexo de uma estrada

“Mas Deus fez o povo rodear pelo caminho do deserto do Mar Vermelho; e armados, os filhos de Israel subiram da terra do Egito.” Êxodo 13:18.

Lembro ter visto reflexos múltiplos de uma linha bem ao longe. Pareciam um labirinto interminável. Resolvi caminhar nessa direção um tanto desorientado pela perplexidade da visão. Mas fui surpreendido pela força de um impulso que me fez romper a esfera do comodismo que ardilosamente me repuxava. Depois da surpresa, fiz uma circunscrição entre as fronteiras da alegria e da tristeza, da felicidade e do sofrimento, do real e do imaginário, e, finalmente resolvi ingressar um pouco mais por esse labirinto. Lá encontrei um terreno pedregoso. Descobri que, inexoravelmente, teria de passar por ele. Num sentido amplo, vi retratados ali na minha frente os anseios de meus eus. Vi estampadas as minhas falsas realizações. Por terem sido gastas em esforços que desceram pelo ralo, fiz tudo em proveito próprio. Vi as angústias e perplexidades de um indivíduo. Vi que fiquei em torno da noção subjetiva e não da objetiva. Lamentei muito quando vi que esse caminho a caminhar era uma estrada refletida pelo espelho. Fiquei decepcionado comigo mesmo, entendi que essa correria desenfreada pelas fantasias da vida ocasionou uma lista de desejos quase indefinidos. Era certo que mais tarde estes se revelariam cada vez mais difusos.

Depois de tanto andar e não chegar a lugar algum, percebi que melhor seria ter percorrido por um caminho mais curto. Como era o ideal para o Povo de Israel no deserto. Não entendo porque preciso andar tanto nessa vida. Será que, ao perseverar por este caminho, veria alguma gloriosa manifestação do poder divino? E, com isso usufruir da vista magnífica da “cidade celestial”? Ver o Cordeiro Santo de Israel contemplando a garantia do embarco? Enfim, seria como o bailar da criança num berço.

Pensar nessa expectativa desse outro caminho é esbarrar na definição do evangelista João, quando obteve a visão apocalíptica. Isso realmente seria maravilhoso. Porém, pela minha própria visão limitada, contristada pelo cansaço da vida, devo falar a não ser por mim mesmo. Minha esperança encontra-se na proposta romântica e gloriosa da estrada real da vida, que apesar de longa, todos nós devemos continuar no percurso. Principalmente pelas indicações claras do Filho do Homem. Afinal, a narrativa bíblica clássica por excelência sempre se concentrou em indivíduos que enfrentam obstáculos para atingir um determinado objetivo. Vejamos por exemplos Abraão, Isaque, Jacó, Davi, Salomão – Na medida que caminhamos, podemos perceber a identidade dos personagens de uma história vitoriosa. Essa narrativa bíblica é construída a partir do realismo, por meio de uma cuidadosa harmonia para que, no final da estrada, possamos olhar para esse reflexo e ver os atos de reconstrução. Penso que esse reflexo não é simplesmente uma descarga de fluxos e imagens, mas que possibilitam enxergar além do que está sendo projetado e prometido.