Lidando com o desencorajamento

O desencorajamento, desde meus primeiros dias na fé cristã, tem se tornado o maior de todos os meus inimigos, e ao longo de 32 anos de fé em Cristo tenho descoberto que ele vem freqüentemente a mim em função, ou melhor, em disfunção da minha maneira errada de encarar as circunstâncias ao redor, e a maneira equivocada em que a partir daí começo a desenvolver meus pensamentos.

Para fazer frente a constantes ataques de desencorajamento, resolvi fazer a mim mesmo quatro perguntas que muito me têm ajudado. Espero que isso possa também de alguma forma ajudá-lo, quando ele bater à sua porta.

1. Estou desencorajado a respeito de alguma coisa sobre a qual não tenho nenhum controle?

Tenho descoberto ao longo desses anos que as coisas que mais me desencorajam são aquelas sobre as quais freqüentemente não tenho nenhum controle. Lembro que quando estava plantando uma igreja nos Estados Unidos, entre imigrantes brasileiros, e quando num determinado domingo a freqüência caía, eu me sentia um verdadeiro fracasso. No entanto, a bem da verdade eu tinha muito pouca influência na decisão de alguém ir ou não ir à igreja num determinado domingo.

Desencorajar-se a respeito de coisas que estão além do meu controle é me colocar numa situação que fatalmente irá me derrotar. Se eu não tenho o poder e o controle de corrigir um certo problema, e ainda assim permito que ele me domine, eu me torno vítima dos meus próprios sentimentos. O que preciso é me focalizar nas coisas que posso fazer, mudar, ou nos problemas que consigo resolver. Pensar dessa maneira é construtivo, positivo, e me deixa encorajado.

2. Estou assumindo a culpa pelo fracasso de alguém?

Lembro com muita clareza a noite em que batizei o jovem e promissor casal Edmílson e Andréia. Nós os encontramos numa tarde de sábado, quando saíamos às ruas para abordar pessoas e com elas compartilhar o evangelho. Naquela noite de domingo, batizar esse casal, realizar seu casamento e vê-los totalmente engajados na nova comunidade cristã era algo que jamais poderia esquecer, uma vez que toda a sua história problemática trouxe um verdadeiro desafio de amor e dedicação de vários membros. A realidade é que sua decisão de receberem e seguirem a Cristo foi alguma coisa simplesmente milagrosa.

Passado menos de um ano, porém, a freqüência deles à igreja aos domingos foi se tornando mais e mais esporádica. Ambos foram esfriando em seus relacionamentos com os membros, envolveram-se em discórdias, e em pouco tempo estavam fora dela, participando de outra comunidade. Como igreja oramos pelo casal insistentemente, e lhes pedimos que não nos deixassem, e que deveriam trabalhar em seu relacionamento, antes que uma decisão de divórcio contra a nossa igreja fosse finalmente tomada. Contudo nossos apelos e orações foram aparentemente em vão. Os conflitos continuaram, eles decidiram sair, foram para uma outra igreja, e pouco tempo depois saíram dela e foram para outra… e outra…

Dois anos depois tomamos conhecimento de que eles haviam se separado. Mas uma tragédia ainda maior estava por vir. Numa tarde de domingo Edmílson chama Andréia para conversarem sobre a partilha de bens em função da recente separação, e no quarto que antes juntos compartilhavam ele toma de um revólver e atira na cabeça dela, matando-a instantaneamente, atirando em seguida contra a própria cabeça.

Essa tragédia abalou a cidade, repercutindo sobre todos que de alguma forma haviam tido algum tipo de envolvimento com o casal. Mas como posso eu me tornar responsável pela insanidade de alguém? A realidade é que quando um dia nos posicionarmos diante de Cristo, “cada um receberá o seu galardão, segundo seu próprio trabalho” (I Co 3:8.). Se por outro lado a questão é a minha infidelidade, tudo de que preciso é encará-la, confessá-la e me arrepender. O verdadeiro arrependimento jamais nos leva ao desencorajamento, e sim à genuína alegria.

3. Estou buscando construir o reino de Cristo, ou o meu próprio reino?

Tenho observado que ministros profissionais – e eu me incluo entre eles – são as pessoas mais competitivas que existem. Quando honestamente avalio o que realmente me traz desencorajamento, tenho que admitir que a razão mais freqüente é a falta de reconhecimento por parte de outros. Quantas não foram as vezes em que ouvi o sermão de um afamado pastor, e aqui dentro de mim pensei comigo: Posso pregar tão bem ou melhor do que ele. Por que esse indivíduo é tão famoso e eu sou um ninguém?…

Há pouco tempo um pastor me disse que ele tinha de mudar para uma igreja maior, porque “precisava de um desafio maior”. Pude me empatizar com esse companheiro porque já experimentei esse tipo de frustração, e de maneira mais freqüente do que gostaria de admitir. A realidade era que naquela pequena igreja e pequena cidade havia desafios para a duração de toda uma vida, para o meu amigo. Eis apenas alguns desses desafios:

Como expandir a demanda de ministério quando se tem um número limitado de pessoas comprometidas com a obra, e quando 80% dos adultos da congregação já estão envolvidos em alguma forma de ministério?

Como alcançar os jovens e adolescentes que têm pouquíssimo ou nenhum contato com a igreja e interesse absolutamente nenhum em coisas espirituais? Como atingir essa moçada, sexualmente ativos e envolvidos com algum tipo de droga e álcool? Se apenas tivéssemos os recursos talvez pudéssemos oferecer um ministério especializado e direcionado a eles…
Como identificar e preencher as carências de uma crescente população que vê a igreja como uma instituição arcaica e irrelevante?

Como atender às necessidades sociais com os parcos recursos que temos à nossa disposição?

À medida que juntos analisávamos a questão do meu colega pastor, chegamos à fria e contundente conclusão de que havia muitas oportunidades de ministério ali mesmo, ali naquele lugar, a fim de estender o reino de Deus.

4. Porventura a minha expectativa não é simplesmente… excessiva?

É absolutamente imperativo e salutar que eu enfrente a dolorosa possibilidade de que a minha ambição pode exceder e em muito os dons que possuo.

Por ter uma personalidade aguerrida e empreendedora, minha tendência natural é de minimizar obstáculos e prosseguir rumo a um alvo empolgante e desafiador. Há vantagens em ter esse tipo de perfil, mas ele me traz problemas e eventualmente retumbantes derrotas. Aliás, há pouco tempo li sobre grandes corporações que muito se prejudicaram por promoverem alguns de seus funcionários para posições que exigiam habilidades que estavam muito acima da capacidade deles. E isso é algo que – decididamente – não quero que aconteça comigo.

Hoje, depois de sofrer alguns reveses exatamente nessa área, passei a me perguntar e a orar mais objetivamente sobre essa questão: até que ponto devo me lançar nas incríveis possibilidades que estão diante de mim e ao mesmo tempo entender que tenho de equilibrar meus próprios dons e habilidades com minhas próprias limitações? Apesar de não haver permitido que alguns dos meus sonhos viessem a morrer, tenho compreendido que preciso aceitar o fato de que estou presentemente servindo a Deus no lugar onde ele me posiciona como mais útil.

Há poucos dias, lendo uma passagem familiar do Novo Testamento me deparei com Jesus e sua oração no jardim, e ali aprendi que ele destilou a essência do seu ministério num princípio básico e essencialmente fundamental: “Eu te glorifiquei na terra, completando a obra que me deste para fazer” (João 17:4).

Ao ler esse texto fiquei mais uma vez desafiado a contemplar a vida e suas perplexidades pelas lentes de Jesus. Para Jesus tudo se resumia em fazer a vontade do Pai – nada mais e absolutamente nada menos. Ao comparar meu coração cheio das suas agendas pecaminosas, lágrimas me vieram aos olhos, e me arrependi pela minha inquietação de alma, pelas minhas preocupações, pela correria, pela auto-suficiência, por colocar tantas coisas na minha agenda que não têm nada a ver com a agenda do Pai. Em meio ao meu quebrantamento, pude ouvir uma voz suave e gentil me comunicando no íntimo do meu ser o que eu mais precisava ouvir: “Nélio, você tem o trabalho que Eu lhe dei; não existe nenhuma outra maneira de trazer glória a mim do que fazer exatamente o que coloquei em suas mãos.”

Uma honesta resposta a essas quatro perguntas me tem ajudado tremendamente em meus momentos de desencorajamento. Espero que isso possa também ser útil a você.

por Nélio DaSilva