Segundo uma pesquisa divulgada em meados do ano passado por The Nielsen Company, os adultos americanos passam uma média de 11 horas – ou quase metade de cada dia – consumindo alguma forma de mídia. Do momento em que acordamos (e instintivamente checamos nossos celulares), através dos nossos deslocamentos diários (com rádio ou podcasts sussurrando no fundo), até o fim do dia (quando temos Netflix em excesso), vivemos essa estatística dia após dia. De acordo com os números de Nielsen, nós passamos mais tempo consumindo mídia do que comendo, dormindo ou fazendo qualquer outra atividade.

Com grande parte de nossas vidas girando em torno do consumo de mídia, cabe a nós desenvolvermos o que Tony Reinke, em seu novo livro Competing Spectacles: Treasuring Christ in the Media Age (Espetáculos Concorrentes: Valorizando Cristo na Era da Mídia), chama de “teologia da cultura visual”. Reinke, um escritor sênior para Desiring God e autor de outro livro focado em tecnologia: 12 Ways Your Phone Is Changing You (12 Maneiras Pelas Quais Seu Telefone Está Mudando Você), surgiu como uma voz profética, uma voz gritando em nossa selva digital: “Façam um caminho reto para o nosso Deus”. Em Competing Spectacles, ele faz uma importante pergunta: “Nesta era de espetáculos… como crescemos espiritualmente?”

Desejando Ser Admirado

A resposta de Reinke forma a base do seu livro, o qual trabalha anedoticamente através de várias formas de espetáculo que são comuns hoje. Ele se prova um exegeta cultural hábil, fazendo observações sobre espetáculos cotidianos e criadores de espetáculos que poucos de nós conseguem pegar.

Para Reinke, um espetáculo é “um momento de tempo, de duração variável, em que o olhar coletivo se fixa em alguma imagem, evento ou momento específico. Um espetáculo é algo que capta a atenção humana”. Ele dá uma atenção especial aos espetáculos gerados pela mídia social, política, televisão e pornografia, entre outros. Em determinado ponto, ele abre janelas fascinantes sobre a dependência de nossa cultura ao espetáculo, tal como o CEO da Netflix, Reed Hastings, afirma que o maior concorrente de sua empresa é o sono.

Da Escritura, também, Reinke extrai exemplos instigantes, incluindo a história de Davi no telhado observando Bateseba. Isto, Reinke declara, “é um protótipo de toda pornografia digital: uma mulher diante dos olhos de um homem não visto”.

Nada disso significa, entretanto, que o espetáculo seja inerentemente ruim. Como Reinke comenta, os seres humanos são “naturalmente predispostos com um apetite insaciável para ver a glória”. O problema com os espetáculos, então, não é que nós os desejamos, mas que nós procuramos glória em todos os lugares errados. Reinke cita um tweet de John Piper que expressa bem esta realidade: “O mundo deseja ser admirado. Esse desejo foi criado por Deus. O mundo procura isso principalmente através de filmes”.

A semana em que li Competing Spectacles coincidiu com o lançamento de Vingadores: Ultimato, o espetáculo cinematográfico da década. Ultimato quebrou recordes de bilheteria, arrecadando 357 milhões de dólares durante seu fim de semana de estreia nos EUA e capturando outros 500 milhões de dólares em sua primeira semana e meia na China. Ele inspirou mais tweets do que qualquer outro filme antes, superando Pantera Negra. Em uma história estranha, mas reveladora, um soldado sul-coreano supostamente ficou ausente do posto, mas sem intenção de abandoná-lo, para assistir um filme. Essas métricas parecem confirmar a hipótese de Reinke, que em nossa busca para saciarmos nossa sede de glória, somos mais rápidos para nos voltarmos para a cisterna vazia de Hollywood do que para a fonte de água viva encontrada em Cristo.

Reinke afirma que Cristo é o espetáculo definitivo, o único digno de nossa inteira atenção. Ele escreve,

Cristo não foi meramente feito um espetáculo na cruz; a cruz se tornou uma referência abreviada para tudo o que é glorioso a respeito de Cristo – sua obra como criador e sustentador de todas as coisas, sua encarnação, sua vida, suas palavras, sua obediência, seus milagres, sua rejeição, seu espancamento, sua crucificação, seu sofrimento com a ira, sua ressurreição da sepultura, sua ascensão celestial, sua coroação real e seu eterno sacerdócio – tudo da sua glória está contemplado em seu espetáculo celestial.

Quando procuramos glória nos espetáculos passageiros deste mundo ao invés de procurarmos em Cristo, o culpado não é um buffet em constante expansão de entretenimentos superficiais; nossos corações pecaminosos são os culpados. Adão e Eva não tinham uma seleção infinita de frutos proibidos tentando-os a rejeitar seu Criador; eles tinham apenas um. E nossos olhos desejosos por espetáculo têm procurado em outros lugares desde então. Desde ídolos antigos aos filmes impregnados com imagens geradas por computador de hoje, as pessoas têm trocado “a glória do Deus imortal por imagens feitas segundo a semelhança do homem mortal, bem como de pássaros, quadrúpedes e répteis” (Romanos 1:23).

Reinke sabiamente evita a ideia do ascetismo digital como uma solução para nossa hiperconexão, em parte porque o espetáculo é tão inevitável em nossa era. Mas a razão mais importante reflete a advertência de Paulo aos colossenses sobre estar cativo a “mandamentos e ensinos humanos” (2:22). Regras como “Não assista”, “Não transmita” e “Não navegue” são apenas isso: regras, feitas por seres humanos caídos e provavelmente administradas não por corações cheios de graça, mas por fariseus digitais ansiosos demais para acusar e condenar. Ao invés disso, Reinke estabelece 10 princípios práticos para quem procura envolver a nossa cultura visual em maneiras que honrem a Cristo.

Quando rejeitar

Competing Spectacles, então, não é um chamado para desistirmos da mídia social ou renunciarmos nossa cultura visual, mas um chamado à autodisciplina. Reinke alude aos primeiros cristãos que lutaram para abolir a indústria romana do esporte sangrento, bem como aos puritanos, séculos depois, que estavam envolvidos no fechamento dos teatros de Londres. Mas Reinke não chama os cristãos de hoje a qualquer forma equivalente de protesto ou ativismo. Por sua própria admissão, Competing Spectacles está mais voltado para desenvolver uma teologia que ajude os crentes a pensar nessas questões em um nível pessoal.

Mas a pergunta ainda permanece: Em que ponto os cristãos devem começar a pensar em como rejeitar a indústria do espetáculo? Considere a pornografia, por exemplo. Enquanto Reinke nos exorta a reivindicar a categoria de pecados do olho, ele não pede aos cristãos que trabalhem para derrubar a indústria pornográfica como um todo.

Outra questão deixada sem solução, talvez porque esteja fora do escopo do livro, é a extensão em que os cristãos devem se envolver na criação de espetáculos. Reinke aborda o debate sobre igrejas usando espetáculos como auxílio à adoração, mas muitas outras questões vêm à mente. Se, de fato, os cristãos devem participar na criação de espetáculos, eles devem se limitar a criar espetáculos que levam uma mensagem cristã? Ou seu envolvimento simplesmente piora o problema colocando mais diversão sobre uma sociedade que já está se afogando nela?

Nos nossos dias, é uma aposta segura que os padrões de consumo da mídia americana continuarão subindo. Afinal, a figura já desconcertante de 11 horas por dia citada por The Nielsen Company representa um salto de 1 hora e meia de apenas quatro anos atrás. Onde estaremos daqui a quatro anos? Daqui a 10? Competing Spectacles não consegue prever este futuro, mas a estrutura teológica de Reinke nos deixa melhor preparados para escolhermos nosso caminho através do barulho e da fanfarra – e fixarmos nosso olhar na incomensurável glória maior que virá.

JOHN THOMAS

John Thomas é um obreiro cristão transcultural que vive e serve no ministério na Ásia Central com sua esposa e seus dois filhos. Ele escreve regularmente em meduim.com/soli-deo-gloria.

Traduzido por Cynthia Rosa de Andrade Marques.
Usado com permissão.